Professor visitante sênior pesquisa História do Campesinato e dos povos indígenas da Fronteira Sul

O Dr. Paulo Zarth é o primeiro Professor Visitante Sênior da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Com uma vivência na região, o professor de História conta, em entrevista, que considera uma experiência rara na carreira acadêmica a colaboração na construção de uma nova universidade.
O professor desenvolverá o projeto de pesquisa com o tema: “História do campesinato e dos povos indígenas da fronteira Sul”. Descendente de famílias camponesas, o assunto interessa ainda mais ao professor, que tem sua carreira acadêmica ligada ao tema. O foco da pesquisa é a história da população camponesa e indígena da região considerando as práticas produtivas, as relações com a natureza e as lutas sociais.
Confira a entrevista com o professor:

- Como e por que surgiu o interesse em ser Professor Visitante Sênior da UFFS?
Quando li o edital da CAPES, achei a proposta inovadora e um grande desafio para um professor – pesquisador com mais de trinta anos de magistério. Colaborar na construção de uma nova universidade é uma experiência única e rara na carreira acadêmica.
Acompanhei o processo de construção da UFFS na região Noroeste do Rio Grande do Sul com atenção e expectativa. Desde os tempos de estudante na UNIJUÍ participei de movimentos estudantis para reivindicar o ensino “público e gratuito” (como dizíamos no final dos anos 70) e “de qualidade” (que acrescentamos agora). Quando surgiu o programa da CAPES imaginei que seria uma boa forma de colaborar com a tão esperada universidade federal na região, que passa a oferecer oportunidade para milhares de jovens, até então excluídos do acesso ao ensino superior. Eu mesmo estudei com dificuldades numa universidade comunitária na qual os próprios estudantes financiavam o ensino superior que o Estado não oferecia para nós, jovens do Norte do Rio Grande e do Oeste de Santa Catarina. Finalmente agora, em pleno século 21, é que o ensino superior federal abre suas portas nessa região como conseqüência de uma longa jornada de reivindicações da sociedade regional.

- Fale um pouco sobre sua carreira de docente.
Comecei minha vida no magistério em 1979, quando ainda era estudante, como professor de história numa escola municipal rural. Trabalhei na escola de educação básica Francisco de Assis, ligada a Universidade e também fui professor da rede estadual de ensino, novamente numa escola rural. Considero essa experiência de 5 anos na educação básica da maior importância na minha formação profissional, pois me deu oportunidade de conhecer o cotidiano escolar. Esse conhecimento ajudou muito no meu trabalho no curso de formação de professores de história na UNIJUI e na UPF, onde podia falar com certa autoridade para meus alunos sobre como ensinar história para as crianças e adolescentes. Uma das minhas experiências mais interessantes foi lecionar para alunos de história da Universidade de Las Palmas de Gran Canaria, como professor convidado num programa interinstitucional do governo da Espanha.
Concluí o curso de Estudos Sociais em 1980 e o de Geografia em 1982. Em seguida me desloquei ao Rio de Janeiro para realizar o mestrado em História na Universidade Federal Fluminense sob orientação do prof. Ciro Flamarion Santana Cardoso. Concluí o curso em 1988 e em seguida iniciei o doutoramento em história orientado pelo prof. Luís Carlos Soares (UFF).
Na dissertação e na tese investiguei a história agrária do Rio Grande do Sul, analisando a agricultura, a escravidão nas estâncias pastoris, o trabalho dos lavradores nacionais (também conhecidos por caboclos) e dediquei uma boa parte da pesquisa para tratar da imigração e da colonização. Enfim, tenho me dedicado a estudar os camponeses e o mundo rural de um modo geral e suas relações com o mundo global.
Trabalhei durante 15 anos no Mestrado em Educação nas Ciências da UNIJUÍ orientando pesquisas e dissertações relacionadas a história, educação e movimentos sociais. Participei também do curso de Mestrado em História da UPF.
Tenho participado ativamente de grupos de trabalho e de pesquisa no campo da história agrária com colegas de diversas universidades e da ANPUH.

- Qual a temática de seu projeto e por que dessa escolha?
O título do projeto de pesquisa é “História do campesinato e dos povos indígenas da fronteira Sul”.
A escolha desse tema está ligada a minha formação acadêmica e as minhas pesquisas. Por outro lado, o mundo rural ocupa a maior parte do espaço na linha de tempo da história da humanidade e da região da UFFS em particular. Considero fundamental investigar e registrar os conhecimentos produzidos pelos camponeses ao longo da história a respeito da natureza e das práticas agrícolas, para construir um arquivo das diversas práticas produtivas e culturais. Além do mundo camponês, a região tem uma história fortemente marcada pelos povos indígenas, principalmente dos povos guarani e kaingang que mantém uma população expressiva que luta por manter seu território e sua cultura e que produziram conhecimentos originais sobre o uso do território. Particularmente, descendo de famílias camponesas e tenho uma forte motivação para investigar esse tema.

- Como será a metodologia do projeto? Quais os principais focos do projeto?
O foco da pesquisa é a história da população camponesa e indígena da região considerando as práticas produtivas, as relações com a natureza e as lutas sociais.
Os arquivos históricos regionais guardam importantes coleções de documentos sobre o tema, (produzidos pela Diretoria de terras e colonização, pelos governos regionais das províncias e pela assembléias legislativas, por exemplo). Importantes textos e documentos sobre a questão aparecem nos órgãos de divulgação das instituições de difusão tecnológica (cooperativas, secretarias de governo, estação agronômica, postos agropecuários e os movimentos sociais), nas revistas e jornais especializados; nas páginas de jornais de circulação geral. Os documentos produzidos internamente pelas instituições também são fundamentais. Para períodos mais recentes é útil recorrer aos depoimentos dos próprios camponeses e indígenas utilizando os reconhecidos métodos da história oral. Existe também um volume razoável de teses e de dissertações sobre os temas enunciados. Todo esse material será analisado numa perspectiva teórica adotada pelas ciências sociais que entende o campesinato como uma forma viável de produção e como um modo de vida defendido por milhões de pessoas no mundo inteiro. Essa perspectiva contaria teorias que defendem a idéia da dissolução inexorável do campesinato em favor de um mundo urbano industrial. Tal idéia é associada à concepção de progresso, entendido como urbano industrial em oposição ao campo. É importante hoje na academia o reconhecimento das relações específicas dos camponeses com a natureza e principalmente dos povos indígenas, que plantaram e colheram por milhares de anos no atual território brasileiro sem grandes transtornos para o meio ambiente.

Professor considera uma experiência rara na carreira acadêmica a colaboração na construção de uma nova universidade

Saiba mais:
O Programa Professor Nacional Visitante Sênior ainda está com inscrições abertas. O professor deve ser doutor há pelo menos dez anos e estar aposentado ou oficialmente licenciado, ser pesquisador nível 1 do CNPq ou equivalente, entre outros compromissos. Na inscrição, o candidato deve apresentar um plano de trabalho. As bolsas aos professores são de R$ 8.905,42 mensais, válidas por dois anos, prorrogável por mais dois, e passagens aéreas entre o local de residência e da instituição.
Todas as informações referentes ao edital podem ser acessadas no site www.capes.gov.br.

maio 24, 2010   Publicado em: Notícias